Como o Japão se tornou o destino queridinho do momento? Especialistas explicam

Como o Japão se tornou o destino queridinho do momento? Especialistas explicam
Publicado em 07/08/2024 às 01:18

O Japão, um país de cultura milenar localizado no Oceano Pacífico, virou um dos destinos da moda em 2024, segundo especialistas ouvidos pela CNN. Diversas celebridades, como Bruna Marquezine, Sasha e João Guilherme, visitaram a ilha e compartilharam os momentos nas redes sociais. Mas só isso foi o suficiente para o destino virar sonho de consumo dos brasileiros?

Segundo dados da Japan Tourism Agency, o Japão bateu recorde histórico de turistas este ano, recebendo mais de 17 milhões visitantes em seis meses. No ano passado, de janeiro a dezembro, foram cerca de 10 milhões. A impressão que dá é que o lugar entrou na moda de repente — mas, na verdade, não foi bem assim.

A especialista Tatiana Marodin, doutoranda em turismo pela Universidade de Caxias do Sul, comentou à CNN Viagem&Gastronomia sobre o que chama atenção dos brasileiros no Japão. Para ela, a cultura exótica, o modo de viver, as construções antigas, a religião e a comida são alguns dos atrativos da ilha.

 

A empresária Patricia Bianco e o chef Tadashi Shiraishi, casal à frente do grupo Omotebako, em São Paulo, do qual faz parte o disputado restaurante japonês Kanoe, também percebem os mesmos interesses dos clientes que levam ao Japão anualmente. Um dos principais focos das viagens, inclusive, é a gastronomia.

“Para nós, a comida é um meio de conectar nossos clientes com a cultura japonesa de forma holística: seus hábitos, seus valores, sua reverência e respeito pelo processo, alimento e profissionais”, afirma.

Os empresários também afirmam que o interesse e procura por esse tipo de viagem aumentou nos últimos anos. “A ponto de atendermos outras agências de viagens, turistas que nunca sentaram no balcão do Kanoe — e se interessam por orientação especializada, curadoria e experiência prévia no Japão para minimizar erros, riscos e aproveitar a viagem com o conceito personalizado que criamos”, afirmaram.

Foi o caso da influenciadora Lu Ferreira, que decidiu conhecer o Japão após anos admirando a cultura do país, em 2024. Ao passar 22 dias na ilha, ela visitou cidades como Tóquio, Osaka e Kyoto. À reportagem, contou ser seu destino dos sonhos desde a faculdade de design gráfico.

“A primeira vez que vi as embalagens de um supermercado japonês, na Liberdade, em São Paulo, fiquei fascinada em como a comunicação visual deles é muito diferente da nossa”, disse. “Chegou esse ano, achei que estava na hora de realizar esse sonho que já adiava há bastante tempo. Afinal, é uma viagem que exige muito planejamento, além de ser mais cara”.

De tudo, o que mais chamou atenção de Lu foi a diferença cultural entre o Brasil e o Japão — distinção que ela viu até nos centros comerciais. “Tudo é tão diferente que até coisas banais são interessantes, como a ambientação de uma loja, que aqui costuma ter muito barulho, sendo que lá [a prioridade] é o silêncio”, comenta.

Apesar de influenciadores terem um papel fundamental nesse cenário, especialistas ouvidos pela CNN Viagem&Gastronomia discutem como o fim do visto entre Brasil e Japão, no final de 2023, incentivou o público a conhecer o país. Para eles, motivos históricos também inspiram, principalmente, os brasileiros a conhecerem a ilha.

Fim da necessidade de visto

As buscas de viagens para o Japão aumentam 135% para brasileiros após isenção de visto, segundo levantamento de 2023, do metabuscador Kayak, em comparação com 2022. A professora Tatiana Marodin pontua que essa medida foi essencial para o boom turístico — já que o processo para conseguir a autorização de entrada era mais difícil do que para países como os Estados Unidos e o Canadá.

“O Japão tinha um dos processos de visto mais burocráticos que a gente conhece”, afirma a especialista. “Exigia uma programação do que você iria fazer no dia a dia — e isso desanimava”.

Já o professor Thiago Allis, especialista em turismo e mobilidades da EACH-USP (Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP), diz acreditar que o fim da necessidade do visto japonês para brasileiros tenha tido certo impacto na escolha pelo país nipônico como destino, mas afirma ser necessário ter parcimônia nessa leitura.

“Arrisco dizer que o Brasil não é um mercado prioritário para o Japão. A política de visto tende a melhorar ou ampliar possibilidades de mais brasileiros irem ao país, mas diria que para o Japão, não”, disse.

Ele comenta que as nações que mais enviaram passageiros para o Japão foram as vizinhas, como China, Hong Kong, Estados Unidos. Isso ocorre devido à proximidade geográfica dessas nações com a ilha — sendo que a distância é um dos motivos que impede o Brasil de fazer mais sucesso para os japoneses.

“A diversidade de opções que japoneses podem ter sem ser o Brasil para fazer turismo é outra razão, sendo que o tipo de produto que o Brasil oferece talvez não seja exatamente o que os japoneses mais buscam nas férias”, pontua Thiago.

Mesmo assim, ele vê a medida de visto sendo interessante para o Japão — por ser uma despesa e burocracia a menos. Ainda defende que a relação histórica entre ambos os países, que aconteceu principalmente após migração nipônica ao Brasil, há mais de um século, cuja comunidade é a maior fora da ilha, é outro motivo para explicar esse boom.

“[O visto] É uma facilitação de um grupo específico, os brasileiros, que pode aumentar a quantidade de visitantes no país. Especialmente porque esses dois países [Japão e Brasil] estão há mais de um século bastante conectados do ponto de vista político cultural”, explica o especialista.

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Movimento, organização, modernidade limpeza de Tóquio impressionam turistas / Unsplash

Cenário econômico mundial

Marodin ainda analisa o cenário econômico mundial, com a Guerra da Rússia e Ucrânia e o período pré e pós-pandemia, como um dos motivos para o atual sucesso do Japão como destino turístico. Isso porque preços de hotéis, por exemplo, eram mais baratos ao redor do mundo antes desses acontecimentos históricos. Depois, passaram a ficar mais caros — enquanto os valores no Japão, que já eram elevados, permaneceram praticamente os mesmos.

Dados recentes do Eurostat apontam um crescimento da economia do Euro acima do esperado em três meses até junho, mas, mesmo assim, as perspectivas para 2024 continuam pessimistas.

“Só para ter uma noção: tem hotéis em Amsterdã, na Holanda, que estão mais caros do que no Japão. Ou seja, caro por caro, as pessoas estão aproveitando para conhecer o Japão. A ilha tem uma inflação muito baixa — as coisas estão praticamente na mesma faixa de preço há 10 ou 15 anos”, disse.

Essa consistência inflacionária não ocorreu na Europa, principalmente, após a guerra entre Rússia e Ucrânia, afirma Marodin — mas esses destinos continuam sendo alvo de procuras excessivas. “Com o medo do corte de gás e energia para ar condicionado, [os preços] acabaram aumentando”, completou.

O Japão não é o único destino do momento, afirmam ambos os especialistas ouvidos pela CNN. Outros locais, como Itália e Espanha, continuam sendo tendência — e enfrentando outro problema: o turismo de massa, cujo excesso de viajantes atrapalha a qualidade de vida dos moradores locais. Por enquanto, esse ainda não é o caso em toda ilha, mas algumas ruas já foram fechadas para preservar o bem-estar dos japoneses. Esse, então, é o ponto que o governo precisa se atentar com o atual sucesso turístico.

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