Como atletas da Ucrânia treinam para a Olimpíada, entre bombardeios e apagões

Como atletas da Ucrânia treinam para a Olimpíada, entre bombardeios e apagões
Publicado em 17/07/2024 às 19:06

A lembrança da invasão russa na Ucrânia em 24 de fevereiro de 2022 está gravada na memória da saltadora olímpica ucraniana Anna Pysmenska.

“Quando a invasão aconteceu às 4 da manhã, fiquei tão chocada que não sabia o que fazer, então às 7 da manhã fui treinar na piscina”, contou a atleta de 33 anos à CNN. “Foi muito assustador”.

Um dos nove atletas ucranianos dos saltos ornamentais que participarão dos Jogos Olímpicos em Paris, Pysmenska não tem mais medo. Ela diz que está com raiva e pronta para lutar — na competição esportiva — por seu país.

Pela primeira vez em 12 anos, a Ucrânia estará representada em todas as disciplinas sincronizadas de salto de plataforma e trampolim de 3 metros, tanto para homens quanto para mulheres.

“Acordamos com explosões”

“Vivemos sob pressão constante”, disse Psymenska, que competirá em sua terceira Olimpíada. “Durante o dia, gastamos toda nossa energia nos preparando para os Jogos. Mas, à noite, acordamos com explosões ou com o som das sirenes. É muito estresse”.

Psymenska nasceu na região central da Ucrânia, mas mais tarde se mudou para viver e treinar na cidade de Luhansk, no leste. Ela saiu em 2014, quando as forças russas ocuparam aquele território.

“Nem mesmo trouxe minhas coisas comigo. Nunca pensei que voltaria lá novamente”, disse a saltadora.

Psymenska diz que tem um sonho recorrente desde que fugiu: ela volta a Luhansk, mas os russos não a deixam sair da cidade. Ela então mudou seu treinamento para Kiev até fevereiro de 2022, quando a Rússia novamente tentou invadir a cidade onde ela morava.

A atleta Anna Pysmenska escondida em um porão na Ucrânia, após a invasão russa em fevereiro de 2022
A atleta Anna Pysmenska escondida em um porão na Ucrânia, após a invasão russa em fevereiro de 2022 / Anna Pysmenska/Arquivo Pessoal

Alimentação prejudicada pela guerra

Após o início da guerra, Psymenska mudou-se para a Croácia com sua equipe antes de retornar a Kiev no verão de 2022. Mas os constantes ataques russos tornam a preparação e a concentração desafiadoras.

“Treinamos todos os dias. Fisicamente, estamos prontos. Mas, moralmente, é bastante difícil. Eu estava histérica há alguns dias. Por causa dos constantes apagões, acabo comendo de maneira incompreensível. Não se pode planejar nada. As luzes nunca estão acesas. É a Idade da Pedra. É muito perturbador”, disse Psymenska.

Apagões e sirenes

À medida que a Rússia continua a atacar as instalações de energia da Ucrânia em todo o país, os apagões se tornaram mais longos. A Federação Ucraniana de Saltos teve que comprar um gerador potente para a piscina onde os saltadores treinam, para lidar com as constantes quedas de energia.

Se uma sirene de ataque aéreo soa durante o treino, os atletas param imediatamente e vão para o abrigo antiaéreo.

“Saltos ornamentais é um esporte difícil”, disse Ilya Tselutin, o técnico da seleção nacional, à CNN. “Antes de pular, você tem que se preparar e aquecer. Voltando depois, os atletas têm que se preparar novamente do zero antes de pular”.

“Esse é o seu front agora”

Estima-se que 136 saltadores de todo o mundo participarão dos Jogos Olímpicos de 2024 na França.

Um painel de juízes dará notas para cada salto, com base em vários critérios, incluindo o quão esteticamente agradável são os movimentos do saltador, a complexidade do salto e a forma como ele entra na água. O salto sincronizado também é avaliado pela sincronia dos movimentos dos dois saltadores.

Mas, para Tselutin, esses Jogos são mais do que apenas o esporte de saltos ornamentais.

“A missão dos saltadores é ganhar medalhas de alto nível e erguer a bandeira ucraniana o mais alto possível. Este é o seu front agora. Mostrar que nosso país é muito forte, que a nação é invencível”, disse ele.

O técnico da equipe nacional de salto ornamental da Ucrânia, Ilya Tselutin, com os membros da equipe / Ukrainian Diving Federation/Divulgação

Uma estreia em Paris

Os Jogos de Paris serão a primeira Olimpíada de Danylo Konovalov, de 21 anos. Ele começa todos os dias às 7 da manhã e tem duas sessões de treino. Se há sirenes de ataque aéreo, ele tenta fazer alguns exercícios físicos enquanto espera no porão.

Konovalov nasceu na cidade de Mykolaiv, no sul da Ucrânia, mas, por causa da invasão, não pode treinar em sua cidade natal.

Em abril de 2022, os russos explodiram um encanamento, deixando a cidade sem água potável. Como resultado, Konovalov primeiro saiu da Ucrânia, mas logo voltou para treinar em Kiev. Seus pais ainda moram em Mykolaiv, uma cidade que as forças russas atacam constantemente.

“Não estou lendo as notícias. Eu me sinto muito mais calmo assim. Minha mãe me liga e me conta como estão as coisas para que eu possa me concentrar no esporte”, disse Konovalov à CNN.

Cerimônia de despedida em Kiev

Em 5 de julho, a equipe de saltos ornamentais teve uma cerimônia de despedida em Kiev. Começou com a bênção de um padre em uma igreja perto da piscina onde os atletas treinam. Konovalov admite que tem algumas superstições que observa religiosamente.

“Tenho um traje de banho da sorte em que pulo bem. Também é importante encontrar o lugar certo para os chinelos. Se o salto der certo, só coloco os chinelos no mesmo lugar”, disse ele.

Se ganhar uma medalha, Konovalov diz que dedicará seu sucesso à Ucrânia e aos seus soldados.

Apesar de tudo o que está acontecendo em seu país, Konovalov diz que tentará dar o seu melhor e manter o foco nos Jogos Olímpicos — essa é sua batalha pela Ucrânia.

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