Minimalismo e conceito: a nova era dos bares de coquetelaria

Minimalismo e conceito: a nova era dos bares de coquetelaria
Publicado em 30/12/2024 às 08:04

À medida que os mundos da culinária e da coquetelaria se entrelaçam cada vez mais, seus princípios também se fundem — e isso fica cada vez mais evidente quando esses conceitos extrapolam as receitas. Existem bares de todos os formatos, tamanhos e conceitos; e, ao pensarmos genericamente em um bar de coquetelaria, a primeira imagem que vem à mente de muitos é a de um balcão com uma prateleira cheia de garrafas expostas, de diferentes formas e cores, geralmente iluminadas como um mosaico de vitrais, proclamando o que o bar tem a oferecer. Só que essa referência está ameaçada.

Hoje, diversos bares ao redor do mundo adotam uma abordagem mais conceitual e minimalista para esse espaço, abdicando da exposição de garrafas e limitando as possibilidades de coquetéis com a intenção de valorizar seus conceitos — que vão desde a elaboração dos próprios destilados e fermentados até a escolha de bebidas não rotuladas de pequenos produtores.

No premiado Tayēr, em Londres (uma das metades do Tayēr + Elementary), as prateleiras do balcão traseiro são povoadas pelos licores feitos na casa, do projeto “Muyu, criado pelos donos Alex Kratena e Monica Berg. No cardápio, os drinques são apresentados sem nomes, apenas com uma lista básica de componentes (por exemplo, Paragon White Penja Pepper Cordial, matcha + chocolate), algo muito comum em restaurantes com estrela Michelin.

Hayden Lambert, cofundador e chefe de bar do Above Board, em Melbourne, que não utiliza garrafas rotuladas nem expostas, diz: “Retire a percepção que as pessoas têm sobre o que é realmente necessário em um bar, porque o que é necessário de verdade em um bar são as pessoas. O álcool é secundário! Se você remove todas as opções extras, sobra apenas o que temos a oferecer”. Lambert acredita que o princípio é o mesmo de um chefe de cozinha, que não apresenta todos os produtos e ingredientes disponíveis para o cliente escolher o que deve estar no menu.

Em Lisboa, no Toca da Raposa, atrás do balcão há apenas pequenos altares com garrafas transparentes sem rótulo, preenchidas com destilados feitos ali mesmo na rotovap (destiladora de laboratório), que não para de funcionar durante o horário da casa e fica exposta em uma vitrine com vista para a rua.

No salão dos fundos do Double Chicken Please, no Lower East Side de Nova York, as bebidas necessárias para o serviço ficam escondidas atrás de um mural, e a maioria dos coquetéis é prebatched (pré-preparados e engarrafados), reforçando a ideia de que o que você vê é o que você recebe. GN Chan, coproprietário do DCP, diz que quer que as pessoas se sintam como se estivessem visitando a casa dele, sentadas na cozinha, bebendo e interagindo umas com as outras.

As novas convenções estabelecidas em bares como Tayēr, Above Board, Toca da Raposa e Double Chicken Please sinalizam uma mudança nas expectativas do que um bar deve oferecer. Existe uma confiança implícita no processo, que muitas vezes conflita quando alguém procura, por exemplo, o seu Dry Martini feito com Tanqueray nº 10. Essas reconfigurações criativas do espaço do bar exigem um tipo de confiança e clareza de visão tipicamente associadas à alta gastronomia.

Uma ampla seleção de bebidas pode até conferir identidade a um bar, mas também pode ofuscá-la. Para Danny Chau, escritor e editor finalista do prêmio da James Beard Foundation em 2019, na pior das hipóteses, a infinidade de opções cria um dilema semelhante à rolagem quase infinita das categorias recomendadas na Netflix: uma ilusão de possibilidade infinita que distrai o cliente do que ele realmente deseja desfrutar.

*Os textos publicados pelos Insiders e Colunistas não refletem, necessariamente, a opinião do CNN Viagem & Gastronomia.

Quem é Thiago Bañares


Bañares, formado em gastronomia pela FMU (SP), foi considerado pelo ranking “Bar World 100”, organizado pela importante publicação Drinks International, uma das 100 pessoas mais influentes da indústria global de bares. Seu restaurante/bar Tan Tan figura – pela terceira vez consecutiva – na lista dos melhores bares do mundo no “The World’s 50 Best Bars”. Ele comanda o também premiado Kotori, considerado o 50° melhor restaurante da América Latina pelo “Latin America’s 50 Best Restaurants”; e está à frente do intimista The Liquor Store, casa que privilegia a conexão entre cliente e bartender e que entrega coquetéis preparados com excelência.

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